Duvidava da realidade.
Seja ela qual fosse simplesmente não descia pela garganta.
Impossível engolir aquilo tudo
Não era como se conformar...
Simplesmente não parecia real.
Olhava em volta e tudo parecia falso, fluido, inconcreto.
Como se a qualquer momento, à menor interferência, fosse se desmanchar.
Como um floco de neve que cai na testa e derrete com o calor.
Por que pensar no floco de neve?
Nunca tinha visto neve na vida, mas foi o que pareceu.
Estava quente, incômodo...
Mas não era calor o que incomodava, embora também incomodasse. Mas algo
parecia sufocante.
Não era como se não pudesse respirar. Mas algo sufocava. E não era
pouco. Precisava sair.
Mas sair de onde?
Para ir pra onde.
E fazer o quê?
Simplesmente impossível de responder.
A falta de uma resposta também era sufocante.
O problema não estava apenas do lado de fora, afinal.
De alguma forma, tudo o que acontecia externamente afetava o lado de
dentro. Por mais que tentasse ignorar, ou separar as coisas, sempre havia algo
que quebrava esses limites.
O isolamento tão sonhado era simplesmente impossível.
Ninguém busca o isolamento por capricho.
Para querer se isolar é preciso um motivo pertinente.
Um motivo banal não é suficiente pra querer se isolar.
Se houver uma lista infindável de motivos banais, a própria lista
contaria como um motivo pertinente.
E havia motivos.
Dos mais banais aos mais pertinentes.
Interação parecia ao mesmo tempo inútil e incômodo.
Quanto mais incômodo, mais inútil. E isso incomodava.
Quando quase tudo na vida parece incomodar, é melhor deixar tudo de
lado.
Mas como?
Tudo briga desesperadamente o tempo todo por atenção.
Como ignorar coisas que gritam e pedem pela atenção o tempo inteiro?
A própria realidade não aceitava ser ignorada.
A realidade que não descia na garganta simplesmente tentava forçar
caminho goela abaixo.
O jeito é dormir...
Mas o sono acabou.
Sempre acaba quando se mais precisa dele.
Os sonhos pareciam dinheiro...
Quanto mais se precisa, menos se consegue.
Estava precisando sonhar.
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